Carluxo é o articulador das fake news contra autoridades públicas, diz PF

A Polícia Federal derrubou a casa do vereador Carlos Bolsonaro (PRB-RJ), o Carluxo, filho do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Segundo investigação sigilosa, conduzida em inquérito no STF (Supremo Tribunal Federal), “Zero Dois” é apontado como articulador de um esquema criminoso de fake news, a partir do gabinete do ódio, contra autoridades públicas nas redes sociais.

A PF relaciona a exoneração do diretor-geral Maurício Valeixo e, consequentemente a demissão do ministro Sérgio Moro, a uma diabólica articulação de Carluxo.

O presidente Jair Bolsonaro queria tirar Valeixo da PF e, ato contínuo, interferir nas investigações do STF e da própria PF.

Após pedir demissão, o ex-juiz Sérgio Moro mostrou ontem (24) ao Jornal Nacional, da Globo, mensagem enviada a ele por Bolsonaro, que continha um link para o site de extrema direita O Antagonista: “PF na cola de 10 a 12 deputados bolsonaristas”. Ato contínuo, o presidente da República escreveu: “Mais um motivo para a troca”.

O inquérito das fake news é coordenado pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, que, a despeito da demissão de Valeixo e Moro, manteve todos os delegados da PF nas investigações.

As investigações identificaram rastros de notícias falsas –contra ministros do Supremo, autoridades políticas e oposicionistas– que levam até Carluxo. O filho do presidente teria um gabinete do ódio cuja finalidade seria disseminar fake news para intimidar, chantagear e ameaçar autoridades públicas nas rede sociais.

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Além, Carlos, a PF também está no encalço do deputado Eduardo bolsonaro (PSL-SP), chamado de “Zero Três” pelo presidente Jair Bolsonaro.

O novo diretor-geral da PF, escolhido por Bolsonaro, é Alexandre Ramagem, hoje diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência). Ele é amigo de Carluxo, exatamente um dos alvos do inquérito da PF que tramita no STF.

Quanto ao novo ministro da Justiça, o presidente da República ainda não bateu o martelo sobre o nome. Ao menos quatro são lembrados para substituir Moro:

  1. Jorge Oliveira, atual ministro da Secretaria-Geral da Presidência;
  2. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região;
  3. Ives Gandra Martins Filho, do Tribunal Superior do Trabalho; e
  4. Alberto Fraga, ex-deputado federal (DEM-DF).

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A delação de Sérgio Moro criou as condições para o impeachment de Bolsonaro

O advogado criminalista Dante D’Aquino, em artigo especial, afirma que o ex-juiz e ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, realizou uma delação na manhã desta sexta-feira (24) que pode levar ao impeachment do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

“As revelações do Ministro Sérgio Moro evidenciam uma clara e direta tentativa de interferência nas investigações, por parte do Presidente em exercício”, diz D’Aquino, lembrando que o ainda ministro gozava no ato da coletiva da presunção da veracidade.

O criminalista recorta que o Presidente da República visou a substituição do comando máximo da Polícia Federal para:

  • proteger interesses pessoais;
  • obter relatórios sigilosos e estratégicos de inteligência;
  • tráfego de influência para obter vantagens em investigações;
  • tentativa de quebra de sigilo em investigação no STF;
  • crimes que pavimentam o impedimento de Bolsonaro.

Dante D’Aquino destaca ainda um trecho do pronunciamento de Sérgio Moro, durante a coletiva desta manhã: “Falei para o presidente que seria uma interferência política. Ele disse que seria mesmo.”

“Há viabilidade para o impedimento”, afirma o advogado criminalista.

Leia a íntegra do artigo de Dante D’Aquino:

A delação de Sérgio Moro

No final da manhã desta sexta-feira, 24 de abril de 2020, em meio a uma pandemia que requer todas as atenções voltadas para a área da saúde pública, aguardamos um deslocado pronunciamento do Ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. Ouvimos uma verdadeira delação. O conteúdo justificou a impertinência da intervenção em meio à pandemia. Com sobras. A sensação era a de retorno aos tempos em que a operação lava jato atuava ao lado da imprensa, publicando delações que traziam incertezas em meio à crise e conduziam dirigentes nacionais à prisão.
Não foi diferente na manhã de hoje.

Ao descrever, em detalhes, que o Presidente da República interferiu no comando da Polícia Federal de modo injustificado e para proteger interesses pessoais, obter relatórios de inteligência, manifestar preocupação com inquéritos policiais que tramitam perante o Supremo Tribunal Federal, além de falsear a motivação da saída do diretor geral da PF (que não foi ‘a pedido’), Moro revelou diversos crimes praticados pelo Presidente da República que permitem o seu impedimento.

Inicialmente, é preciso destacar que o Ministro da Justiça, no exercício de suas funções, goza de presunção de veracidade e legitimidade em todos os seus atos administrativos, incluindo-se pronunciamentos, conforme disposto pela Constituição da República, em seu artigo 37. Portanto, por se tratar de um agente público, da administração direta, investido no cargo, suas revelações possuem presunção de veracidade e valor probatório mais elevado do que um mero depoimento civil.

Dentro desse contexto jurídico inafastável de presunção de veracidade, ao afirmar que o Presidente da República visou a substituição do comando máximo da Polícia Federal para proteger interesses pessoais, tais como obter relatórios sigilosos e estratégicos de inteligência, manter contato direto com o comando máximo da polícia para esse fim, além de objetivar acesso ao conteúdo de investigações que tramitam sob sigilo no Supremo Tribunal Federal, o Ministro revelou a prática manifesta de crimes por parte do chefe do Poder Executivo Federal, que pavimentam a estrada do impedimento.

Quando pouco, temos a prática de ato de improbidade que configura, por conseguinte, crime de responsabilidade, conforme o microssistema penal previsto inicialmente no parágrafo 4º, do artigo 37, da própria Constituição da República. Sistema esse que é disciplinado pela lei 1.079/50, em seu artigo 4º, inciso V. Nesse tecido legislativo, temos que a Constituição prevê que os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, sem prejuízo da ação penal cabível. Por seu turno, a lei 1.079/50 dispõe que a prática da improbidade administrativa é crime de responsabilidade que pode gerar a perda do cargo, com inabilitação, por até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública.

Mas não é só.

As revelações do Ministro Sérgio Moro evidenciam uma clara e direta tentativa de interferência nas investigações, por parte do Presidente em exercício. Observe-se que, em suas declarações, o Ministro destaca: “Falei para o presidente que seria uma interferência política. Ele disse que seria mesmo”, afirmou Moro. Trazendo a revelação fática para suas implicações jurídicas, temos que tal comportamento pode configurar o crime de obstrução de justiça, previsto na lei 12.850/2013, em seu artigo 2º, parágrafo 1º, pois quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de infração penal, pratica a conduta proibida pela mencionada lei.

Claro, deverão estar presentes os demais elementos constitutivos do crime, nesse caso, a existência de um inquérito no STF que apure a formação de uma organização criminosa, situação que, no entanto, parece estar preenchida pelo Inquérito 4.781/2019, que tramita no Supremo Tribunal Federal sob a presidência do Ministro Alexandre de Moraes.

Ouvimos uma revelação detalhada de atos do Presidente da República que configuram a prática de crimes. Há viabilidade para o impedimento. As declarações possuem presunção de veracidade e legitimidade. Presunções que podem ser afastadas, pois são relativas. Resta saber o que o presidente da Câmara dos Deputados irá fazer com as dezenas de pedidos de impedimentos que serão protocoladas na próxima semana com os fundamentos dados pela delação de Sérgio Moro.

*Dante D’Aquino. Sócio do VGP Advogados. Mestre em Direito Penal Empresarial, especialista em Direito Constitucional, Professor De Processo Penal.